sexta-feira, 3 de junho de 2011

Homossexualidade

O presente trabalho surge no âmbito da cadeira de Perspectivas Africanas de Fenómenos Psicológicos com intuito de abordar aspectos inerentes ao assunto homossexualidade.
A sociedade tem valores culturais dominantes em cada época e um sistema de exclusões muitas vezes baseado em preconceitos estigmatizantes. Contudo, nas últimas décadas, mudou a maneira de encarar o homossexualidade. Com a evolução dos costumes e a mudança dos valores, dos conceitos de moral e de pudor, o tema referente à opção sexual deixou de ser assunto proibido e hoje é enfrentado abertamente, sendo retratado no cinema, nas novelas, na mídia como um todo.
A época e o local determinaram o tratamento que se deu aos homossexuais: prática comum e bem tolerada na Grécia, Pérsia, Roma e China, mas condenada entre os Assírios, os Hebreus e os Egípcios. Entre os índios brasileiros, assim como em algumas sociedades africanas, as reações frente ao relacionamento entre pessoas do mesmo sexo variam desde a aceitação, como uma expressão legítima da sexualidade, até a rejeição absoluta. Com o advento do cristianismo, a homossexualidade torna-se, em certos períodos, um crime passível de morte.
Para a elaboração do trabalho recorreu-se à revisão bibliográfica e, para a sua melhor compreensão, o trabalho apresenta a seguinte estrutura: conceitos; antecedentes históricos da homossexualidade; causas possíveis; perspectiva africana sobre a homossexualidade; consequências do preconceito social contra homossexuais e suas repercussões psicológicas; considerações finais e, por fim, as referências bibliográficas.

CONCEITOS

Identidade sexual: o termo refere-se à sensação interna de um indivíduo sobre ser masculino ou feminino, menino ou menina, homem ou mulher (Cardoso, 2008: 68).
Orientação sexual: o termo refere-se aos desejos e preferências de um indivíduo referentemente ao sexo dos parceiros íntimos. Como a identidade sexual, a orientação sexual baseia-se em construções psicológicas conscientes e inconscientemente profundas (idem:71).
Homossexual: origem etimológica grega, significando homo, que exprime a idéia de semelhança, igual, análogo, ou seja, homólogo ou semelhante ao sexo que a pessoa almeja ter. Portanto, pode considerar-se a homossexualidade como sendo a atracção emocional e sexual entre duas pessoas do mesmo sexo (Cardoso, 2008: 72)

ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA HOMOSSEXUALIDADE
Ao longo da história da humanidade, os aspectos individuais da homossexualidade foram admirados, tolerados ou condenados, de acordo com as normas sexuais vigentes nas diversas culturas e épocas em que ocorreram. Quando admirados, esses aspectos eram entendidos como uma maneira de melhorar a sociedade; quando condenados, eram considerados um pecado ou algum tipo de doença, sendo, em alguns casos, proibidos por lei.
Nessa altura, existia uma visão peculiar que não distinguia o afecto e a prática sexual. Segundo o artigo Historia do Mundo (s/d), as relações sexuais não eram hierarquizadas por meio de uma distinção daqueles que praticam optavam pelos hábitos homo ou heterossexuais. Na Grécia, por exemplo, o envolvimento entre pessoas do mesmo sexo chegava, em certos casos, a ter uma função pedagógica. Na cidade-Estado de Atenas, os filósofos colocavam o envolvimento sexual com seus aprendizes como um importante instrumento pelo qual se estreitavam as afinidades afectivas e intelectuais de ambos. Encontramos a Pederastia, que para os gregos era o amor de um homem (geralmente com idade acima de trinta anos) por um adolescente (entre os catorze e os dezesseis anos). A relação sexual entre pessoas adultas do mesmo sexo não era comum e, quando ocorria, era reprovada, principalmente entre dois homens, pois havia a preocupação com a questão da passividade. Um homem não podia ter complacencias passivas com outro homem, muito menos se este fosse um escravo ou de classe inferior (Dover, 1978).
A prática da homossexualidade dentro do contexto da pederastia não era excludente. Ou seja, o facto do homem ter a sua esposa não era impedimento para que se relacionasse com um adolescente. E nem o facto de se relacionar com o adolescente significava o fim do seu casamento. A pederastia dificilmente alterava a imagem do homem perante a sociedade, pois o amor ao belo, ao sublime e o cultivo da inteligência e da cultura não tinha sexo.
A relação entre pessoas do mesmo sexo teve lugar também em Esparta, porém com um sentido um pouco diferente da vista em Atenas. Além das relações de pederastia, eram estimuladas as relações entre os componentes do exército espartano e tinha por objetivo torná-lo mais forte. O que levava os comandantes do exército a estimular esse tipo de relação era o facto de acreditarem que um amante, além de lutar, jamais abandonaria outro amante no campo de batalha (Spencer, 1996).
No século XIX, com a efervescência das teorias biológicas e o auge da razão como verdade absoluta, teorias queriam dar uma explicação científica para o homossexualismo. No século XX, a lobotomia cerebral foi declarada como uma solução cirúrgica para quem quisesse se livrar do hábito. Nesse mesmo período, diversos grupos lutaram pelo fim da discriminação e a abolição da classificação científica que designava o homossexualismo como doença (Historia do mundo, s/d).

TEORIAS SOBRE A ETIOLOGIA DA HOMOSSEXUALIDADE
Não existe unanimidade sobre o assunto e por isso existem várias teorias que incluem cerca de 65 factores que pretendem explicar a etiologia da homossexualidade. Na área da Psicologia, a homossexualidade é encarada como um distúrbio de identidade, e não como uma doença. Também não é hereditária nem é uma opção consciente ou deliberada. Para o psicólogo Roberto Graña citado por Dias (s/d), é fruto de um determinismo psíquico primitivo, que tem origem nas relações parentais desde a concepção até os 3 ou 4 anos de idade, quando se constitui o núcleo da identidade sexual na personalidade do indivíduo, que irá determinar sua orientação sexual.
Teoria Psico – Social: defende que as causas da homossexualidade têm origem nas famílias patogénicas, responsáveis pelo desenvolvimento de alguma perturbação nos relacionamentos familiares, nos primeiros anos de vida. Esta patologia seria desencadeada por mães demasiado protectoras, possessivas e castradoras, e pais demasiado distantes ou passivos, que não transmitem afecto. Assim sendo, meninas que não desenvolvem um vínculo afectivo saudável com as mães poderão tornar-se lésbicas e meninos que não desenvolvem esse vínculo afectivo saudável com os pais poderão tornar-se homossexuais. A importância desta teoria é reforçada pelo peso de alguns estudos, os quais afirmam que a condição essencial para o desenvolvimento da orientação homossexual é o défice de afectividade com o progenitor do mesmo sexo. Nesta teoria ainda cabem factores como a exposição à pornografia, à violência doméstica, ao adultério dos pais, ao abuso sexual, entre outros, enquanto factores de perturbações da identidade sexual (Coelho, s/d).
Teoria Antropológica: defende que a homossexualidade é simplesmente o resultado de uma escolha de um estilo de vida por parte do indivíduo (Coelho, s/d).
Teoria Totalista ou Eclética: admite a combinação de vários factores presentes nas teorias anteriores. Nesta questão, não se pode falar em causas, mas sim em múltiplos factores potenciadores do problema (Coelho, s/d).

PERSPECTIVA AFRICANA SOBRE A HOMOSSEXUALIDADE
«Os verdadeiros africanos são naturalmente heterossexuais.» - Robert Mugabe
Em 1905, o pastor Henri Junod, da missão suíça da África do Sul, ratificava a mesma presunção para a região de Maputo: «O paganismo grego conhecia esta imoralidade, e praticou-a, mas o paganismo bantu, pelo menos na nossa tribo, qualquer que seja a sua corrupção, não a conheceu. E mesmo hoje, embora se pretenda que esta forma de vício penetrou em certas partes do território por onde a tribo se espalha, como no Maputo, a povoação indígena tem-lhe verdadeiro horror.» (Mott, s/d).
Ainda de acordo com Mott (s/d), embora reconhecendo a presença do homoerotismo entre populações africanas quando menos desde os meados do século XIX, atribui-se sobretudo aos árabes comerciantes de escravos, turcos ou africanos islamizados, sua disseminação no continente negro. Os sudaneses apontavam os piratas turcos como os responsáveis pela expansão do “vício”, enquanto os grupos bantus orientais culpavam os núbios pelo mesmo mal. Por trás do mito da inexistência do homoerotismo na África pré-colonial estavam dois mitos não menos preconceituosos: a naturalização da sexualidade dos negros, que, movidos pelo instinto animalesco, desconheceriam os vícios antinaturais dos brancos e a superioridade física do primitivo africano, avesso à efeminação própria do mundo civilizado (Mott, s/d).
O autor acrescenta que os historiadores apontam para o facto de que várias sociedades africanas têm indivíduos ligados à magia, à religião e ao espiritual com comportamentos transexuais. Por exemplo, entre o povo Cuanhamas de Angola, muitos chefes espirituais vestem roupas de mulher, fazem trabalho feminino e até se tornam esposas de homens que, certamente, teriam outras esposas do sexo biológico feminino.
Na sociedade Zulu, também é possível observar médiuns que se vestem como mulheres. Na verdade, o médium - pessoa que permite aos mortos transmitir conselhos aos vivos - é considerado um ser feminino, embora possa ser na realidade um homem vestido de mulher. Nesta construção, ele é chamado de “Chefe das Mulheres” e reconhecido como mulher enquanto desempenha as funções de médium. Entretanto, não foi isso o que ocorreu quando os europeus começaram a olhar para as culturas que haviam descoberto nas Américas e se depararam com idéias e práticas que consideravam bárbaras e demoníacas: o sacrifício humano, o canibalismo ritual, a poligamia, a homossexualidade institucionalizada e a nudez desavergonhada. Assim, baseados em suas crenças, os cristãos europeus concluíram que aqueles novos povos eram dominados por Satanás, sendo fundamental que essa gente se convertesse ao cristianismo, mesmo que sob ameaça e persuasão, para que então pudesse ser separada de seu passado (Mott, s/d).
Segundo dados da International Lesbian and Gay Association (ILGA), a prática da homossexualidade é ainda hoje considerada ilegal em vários países africanos. Em três países ainda há pena de morte contra os homossexuais: Nigéria, Mauritânia e Sudão. Nos últimos anos, diversas têm sido as autoridades destes países, sobretudo ex-colônias inglesas, que divulgaram declarações extremamente homofóbicas ou adotaram medidas altamente repressivas contra os homossexuais (Mott, s/d).
De acordo com o relatório Amnistia-internacional (s/d) sobre África, pessoas continuam a ser discriminadas por causa da sua orientação sexual, real ou entendida, em vários países. As pessoas lésbicas, homossexuais, bissexuais e transexuais, bem como os activistas dos direitos humanos que trabalhavam para as defender, foram perseguidas e intimidadas. Algumas estavam sujeitas a detenções arbitrárias e maustratos. Vários parlamentos da região introduziram nova legislação para criminalizar ainda mais a homossexualidade.
No Uganda, por exemplo, o Parlamento apreciou uma Lei Anti-Homossexualidade que reforçava ainda mais as leis discriminatórias existentes, ao propor novos crimes como a "promoção da homossexualidade". A Lei previa ainda a imposição da pena de morte e da prisão perpétua para determinados crimes .
A Constituição da República de Moçambique prescreve o princípio da não-discriminação, no artigo 35: todos os cidadãos são iguais perante a lei, gozam dos mesmos direitos, estão sujeitos aos mesmos deveres independentemente da cor, raça, sexo, origem étnica, lugar de nascimento, religião, grau de instrução, posição social, estado civil dos pais, profissão ou opção política. Segundo LAMBDA (2011), a Lei-Mãe não faz aqui qualquer referência à orientação sexual,. Assim, não há nenhuma lei em Moçambique que criminalize a homossexualidade, isto é, nenhum instrumento legal faz menção clara à homossexualidade, com isso, a homossexualidade não constitui crime no nosso país.

CONSEQUÊNCIAS DO PRECONCEITO SOCIAL CONTRA HOMOSSEXUAIS E SUAS REPERCUSSÕES PSICOLÓGICAS
A categoria de preconceito associada à orientação sexual chama-se heterossexismo, que é um conjunto de crenças culturais, muito difundidas, e de valores, que define a heterossexualidade como a única forma válida de expressão sexual e estigmatiza e critica todas as formas não heterossexuais de comportamento (Herek, 1990 citado por Magalhães, s/d).
A discriminação e o experienciar tratamentos negativos da sociedade relaciona-se com um maior número de problemas psicológicos. Os mitos e estereótipos transmitidos no seio da sociedade, ao serem internalizados pelos homossexuais, pode chocar com a sua identidade, corrompendo fortemente o sentido de valor pessoal e de auto- estima ("vou beber para esquecer, "não interesso a ninguém", "eu não presto enquanto homossexual"). Estas atitudes e sentimentos negativos, internalizados no homossexual, estão relacionados com depressão, ansiedade, alcoolismo, abuso de substâncias, distúrbios alimentares, ideias suicidas e suicídio (Magalhães, s/d).
Segundo Leal & Pereira (2005), a reacção dos pais à homossexualidade dos seus filhos é imprevisível, facto este que pode colocar stress acrescido à relação pais/filhos. Os jovens homossexuais provenientes de famílias com valores morais mais tradicionais revelam-lhes menos a sua homossexualidade do que os jovens provenientes de famílias com valores sócio-culturais menos tradicionais.
Segundo Elizur e Ziv (2001) citados por Leal & Pereira (2005), a existência de uma família heterossexista ou demasiado protectora representa um factor de risco para o desenvolvimento identitário das pessoas homossexuais. Para os autores, são factores preditivos de uma boa adaptação psicológica as seguintes variáveis: apoio familiar, aceitação familiar e conhecimento da homossexualidade no seio familiar.
No entanto, alguns estudos suscitam uma reflexão mais aprofundada sobre este assunto, uma vez que é possível que a abertura familiar possa ter um impacto negativo. D’Augelli, Hershberger e Pilkington (1998) citados por Leal & Pereira (2005), referem que os jovens que informam os seus familiares acerca da sua orientação sexual registam maior abuso físico e verbal por parte desses mesmos familiares e maior suicidalidade do que aqueles que não informam.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há uma tendência, nas últimas décadas, para o casamento entre heterosexuais diminuir e aumentar o número de divórcios, a nível mundial, ao passo que gays e lésbicas lutam, no mundo inteiro e constantemente, para ter o direito de se casar com os seus semelhantes. Nos países que já legalizaram o casamento gay, assim como naqueles que aprovaram as uniões ou parcerias civis entre pessoas do mesmo sexo, tais contratos têm sido coroados de êxito, revelando-se mais duradouros do que os contraídos entre os casais heterosexuais.
Apesar destes dados, culturalmente, em algumas sociedades africanas, a homossexualidade não é aceite, tanto que estes ainda são punidos. Um dos factores que suporta essa não aceitação é a da impossibilidade da reprodução (porque naturalmente o objectivo da vida é a reprodução, feita por um homem e uma mulher).
Ainda não se sabe ao certo a origem da homossexualidade, razão pela qual existem várias teorias para explicá-la. Esta pode ser de origem biológica tendo o temperamento e os interesses pessoais do indvíduo, ou ainda, pela aprendizagem social do indivíduo, pelo que as relações sociais de um indivíduo mantém (como, convivência com indivíduos do mesmo sexo, por longos periodos de tempo, por exemplo nas prisões, ou ainda, pela influência dos meios de comunicação, etc.), definem, em grande parte, os seus comportamentos, que são vistos de forma relativa, pois para um certo grupo pode ser normal e aceitável, mas para outro não será. Além das hipóteses apresentadas, várias ainda poderão surgir, pois trata-se de um tema complexo e pode ser explicada sobre várias perspectivas e focadas em determinadas áreas do fenómeno.
Do mesmo modo que, nos princípios do século XX, era inadmissível que uma mulher vestisse calças, hoje esse facto já é, mundialmente, aceite; assim, ainda vai levar algum tempo para a aceitação total da homossexualidade, mas este facto não é impossível, pois o mundo está em constante mudança.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Cardoso, F.L. (2008). O conceito de Orientação Sexual na encruzilhada entre sexo, género e motricidade in Revista Interamericana de Psicologia, 42(1), pp. 68-72
Ceccarelli, P. R. (2008). A Invenção Da Homossexualidade. Disponível em http://www.ceccarelli.psc.br/artigos/portugues/html/invhomo.htm
Coelho, L (s/d). A Homossexualidade. Acessado no dia 18 de Março de 2011 em http://iebgaia.files.wordpress.com/2010/03/homossexualidade1.pdf
Dias, M. B. (s/d). União homossexual: aspectos sociais e jurídicos. Disponível em http://www.gontijo-familia.adv.br/novo/artigos_pdf/Maria_berenice/Uniaohomo.pdf
Dover, J. (1978). A homossexualidade na Grécia antiga. São Paulo: Nova Alexandria
Guimarães, L. (2003). História da homossexualidade. Acessado no dia 17 de Março de 2011 em http://www.rea.pt/forum/index.php?topic=1494.0
Historia do mundo (s/d). Historias da homossexualidade. Acessado no dia 17 de Março de 2011 em http://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/historiahomossexualidade.htm
Leal, I. & Pereira, H. (2005). A identidade (homo)sexual e os seus determinantes: Implicações para a saúde. Acessado no dia 18 de Março de 2011 em http://74.125.155.132/scholar?q=cache:W98vbMIBwVIJ:scholar.google.com/+A+identidade+%28homo%29sexual+e+os+seus+determinantes:+Implica%C3%A7%C3%B5es+para+a+sa%C3%BAde&hl=pt-PT&as_sdt=0,5&as_vis=1
Magalhães, F. (s/d). Consequências do preconceito social exercido contra gays, lésbicas e bissexuais e suas repercussões psicológicas. Acessado no dia 17 de Março de 2011 em http://www.fernandomagalhaes.pt/preconceito_sexual.html.
Mott, L (s/d). Homo-afetividade e direitos humanos. Universidade Federal da Bahia
Spencer, C. (1996). Homossexualidade - uma história. São Paulo: Record

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